[Valor Econômico] Brasileiros buscam MBA para tentar a sorte fora

01/02/2017

A crise política e econômica no Brasil está gerando bons negócios ­ ao menos para os MBAs internacionais. Desde o ano passado, quando a turbulência interna atingiu o seu auge, as escolas de educação executiva no exterior vêm registrando um aumento expressivo de inscrições de brasileiros interessados em passar uma temporada fora do país, turbinar o currículo e ambém em aumentar as suas chances conseguir um emprego global.

Um levantamento divulgado este ano pelo Graduate Management Admission Council (GMAC), instituição responsável pela aplicação do GMAT, teste essencial de admissão em muitas escolas de negócios, aponta que o Brasil está na lista dos países com maior aumento de candidatos para MBAs de um e dois anos. O crescimento é parte de uma tendência que já vinha se
consolidando nos últimos anos ­ de 2011 a 2015, as candidaturas de brasileiros ao GMAT tiveram uma alta de 27% ­, mas a crise acelerou esse processo.

“No último ano, o aumento de demanda de brasileiros querendo estudar no exterior foi significativo e vem sendo fortemente relacionado com a falta de oportunidades no país”, afirma Maurício Betti, diretor da consultoria MBA Empresarial. Segundo ele, desde 2015 novos perfis de interessados vêm surgindo: profissionais que não conhecem muito bem os programas de MBA e seus processos de admissão, mas que veem a formação executiva como uma possibilidade de emigrar e abrir novas oportunidades de carreira. “Em muitos países, o aluno tem um visto especial de permanência após o curso, e isso atrai quem busca uma recolocação internacional”, diz.

Nos EUA, por exemplo, o recém­ graduado em um MBA se qualifica a um ano extra de visto para trabalho prático opcional ­ e depois disso, pode ser patrocinado pelo empregador e permanecer legalmente no país. Na Europa, alguns países oferecem condições de permanência flexíveis para profissionais recém­ saídos dos MBAs.

É o caso da Holanda, que tem um programa especial que oferece incentivos fiscais para evitar que migrantes qualificados deixem o país. O fato de ter um clima econômico mais estável e um mercado de trabalho atrativo também interessa aos brasileiros, afirma Rick Rudolph, líder da área de recrutamento e admissões do programa de MBA da Rotterdam School of Management (RSM). Este ano, a escola registrou um recorde de candidaturas do Brasil: seis vezes mais do que em 2015. Nos cinco anos anteriores, o crescimento total de solicitantes foi de 19%.

Uma das alunas da RSM é a mineira Andrea Onofri, que participa do full time MBA. Engenheira de produção, ela atuou em consultoria e na indústria automotiva até ser contratada pela Vale, onde trabalhou por cinco anos. Com a queda dos preços internacionais das commodities e a crise, a empresa promoveu cortes e Andrea decidiu que era a hora de fazer um MBA, projeto que vinha adiando desde o fim da faculdade.

“Visitei algumas escolas dos Estados Unidos, mas achei o curso de dois anos muito longo e os alunos muito jovens”, diz. Após considerar MBAs no Canadá e em países na Europa, decidiu pela opção com maior diversidade nas escolas. Na atual turma, ela convive com 100 colegas de 40 nacionalidades.

A diversidade das turmas e o networking global são alguns dos principais motivos que levam os brasileiros a buscar uma formação executiva fora do país, explicam os representantes das escolas de negócios. Um relatório divulgado no ano passado pela Association of MBAs (AMBA) mostra que os cursos de MBA em tempo integral nos EUA e na Europa têm, em média, mais de 80% de alunos internacionais, enquanto na América Latina esse índice é de 5%.

Daniela Mendez, representante da IE Business School no Brasil, afirma que a rede de contatos internacional vai além da abertura profissional para novos mercados ­ a diversidade nos MBAs ajuda o participante a repensar a maneira de fazer negócios. “O contato com variadas culturas e experiências é extremamente enriquecedor para que o aluno analise o seu mercado de forma diferente e traga a inovação de volta ao seu país”, diz.

O reitor associado do MBA da escola de negócios francesa HEC, Andrea Masini, explica que os programas internacionais podem ajudar os brasileiros a “olhar para fora”. “Eles estão entre os nossos melhores candidatos, mas sempre pensam nos desafios internos do país sem necessariamente ter uma perspectiva internacional”, afirma.

Dados do GMAT apontam que o Brasil está entre os países com maior aumento de candidatos para MBAs

Masini ressalta que as especializações em empreendedorismo estão entre as de maior interesse dos alunos do Brasil. “Muitos querem voltar ao país e abrir seu próprio negócio”, diz. O caráter empreendedor do brasileiro é destacado também por Daniela Mendez, do IE. “Para a escola, é uma grande vantagem ter alunos brasileiros: eles sabem enxergar oportunidades e querem por em prática o aprendizado nas empresas onde trabalham ou no próprio negócio.”

Graduado em 2015 pelo MBA do IE, Ernesto Tejo fez o curso online enquanto trabalhava no Brasil, e participou de três módulos presenciais na Espanha. Os objetivos de carreira eram variados ­ além de buscar uma oportunidade na Europa, Tejo queria mudar de área de atuação. “A crise não foi o principal fator motivador da busca pelo MBA, mas pesou muito na escolha de um programa internacional”, conta.

Durante o curso, ele foi amadurecendo a ideia de empreender. Em março deste ano, três meses após a graduação, Tejo mudou­se para a Espanha, abriu um negócio com ex­colegas e, ao mesmo tempo, foi contratado por uma empresa em Madrid. “Quando fiz o MBA, não tinha uma definição muito clara das oportunidades que iriam se abrir. Hoje, não tenho planos de voltar ao Brasil”, diz.

A decisão de permanecer no exterior também foi tomada por Andrea Onofri. Ela já está participando de processos seletivos e pretende ficar pelo menos dois anos na Europa antes de decidir se retornará ao Brasil. “Dessa forma, também consigo pagar o investimento que fiz no curso ­ no Brasil, levaria pelo menos o dobro do tempo para conseguir esse retorno financeiro. Além disso, também há outras questões como segurança e qualidade de vida”, diz.

Rick Rudolph, da RSM, afirma que muitos graduados brasileiros da escola decidem permanecer na Holanda por mais tempo que o inicialmente planejado. “No começo do curso, eles são normalmente muito patriotas e falam em voltar para investir no Brasil, empreender. Com o tempo, a atratividade do mercado faz com que eles mudem de ideia e queiram permanecer por alguns anos antes de retornar”, diz.

Ele alerta, porém, para o oportunismo de candidatos que optam pelo MBA pelas “razões erradas”. “Nós evitamos admitir profissionais que estão passando por uma crise de carreira ou que pensam apenas no próximo salário e cargo”, diz. Os candidatos que veem a educação executiva apenas como porta de entrada para um visto de trabalho também se incluem nessa categoria.

As escolas se mantêm atentas para evitar profissionais com um perfil considerado oportunista. “O processo seletivo é muito detalhado. Existem restrições de experiência, idioma, potencial e até idade em alguns cursos. O brasileiro que é admitido na escola tem todas essas características ­ a crise é só um dos itens que pode motivar mais pessoas a buscar a educação executiva”, afirma Daniela, do IE.

Betti, da MBA Empresarial, afirma que muitos interessados não consideram as exigências das escolas ao decidir fazer um MBA ­ além do histórico acadêmico e profissional, é preciso ter boas notas no GMAT e nos testes de proficiência em inglês. “Muitos querem entrar nos melhores programas, mas eles são extremamente competitivos e só aprovam de 8% a 15% dos candidatos”, diz.

Ele ressalta, no entanto, que existem escolas e cursos para todos os perfis. “Há escolas bem posicionadas nos rankings e que oferecem oportunidades diversas para os alunos. Em muitos casos, o MBA não é nem mesmo aconselhado ­ existem programas de tempo parcial, extensões e cursos de curta duração de excelente qualidade, dependendo do objetivo do profissional”, diz.

Há uma tendência de que esses programas diversificados ganhem mais espaço, especialmente entre os alunos latinoamericanos. O CEO da AMBA, Andrew Main Wilson, aponta um crescimento constante de candidaturas a programas em tempo parcial e MBAs executivos. “O MBA sempre foi e será respeitado, mas as opções dos candidatos vêm evoluindo”, diz.

Até as expectativas mudaram: segundo pesquisa da AMBA, 81% dos participantes dos cursos priorizam viajar e viver situações diferentes a ganhar um alto salário. Independentemente de nacionalidade ou situação econômica do país de origem, desenvolver uma carreira internacional está entre os maiores desejos dos alunos.

 

Fonte: http://www2.mbaempresarial.com.br/images/noticia_valor_MBA.pdf